Quem mais poderia levar as crianças de casa para a sala de aula bem
na hora do expediente? E ainda brincar com elas no chão, ensiná-las as
primeiras lições e até marcar consultas com o pediatra? No sub-bairro
Guandu Velho, em Santa Cruz, só mesmo Sônia Maria de Sousa, a “tia” que
ao abrir um centro de estudos tornou-se uma mãe para as crianças e até
para os pais.
Dos 54 anos de vida, Tia Sônia dedicou 22 deles aos
filhos (dos outros) no Centro de Estudos Alternativo, que abriu as
portas no dia 19 de abril de 1992 para reforçar o aprendizado escolar de
meninos e meninas da região.
- Eu me sinto mãe de todos. Vou eu
mesma buscá-los em casa quando faltam. Como conhecem a minha voz, peço
para uma criança chamar no portão até abrirem. Se a mãe está trabalhando
e eles ficam em casa, eu me sinto como se estivesse ajudando a passar a
perna na mãe deles - brinca Tia Sônia.
Na grade das tarefas
extracurriculares também está a marcação de consultas (com o
conhecimento dos pais, que levam os filhos ao médico). É que muitos
responsáveis saem de casa para trabalhar às 5h e só voltam às 21h:
-
Aqui é muito longe. Se a mãe perde um dia de faxina, perde R$ 80. E se a
professora identifica que a criança tem dificuldades, pede para a mãe
procurar um especialista. No posto, a pediatra indica um fonoaudiólogo,
por exemplo. Nós só procuramos a vaga e marcamos a consulta.
É
assim com os cerca de 100 alunos da casa azul e branca de dois andares,
onde funciona o centro de estudos, que oferece até momentos de
relaxamento.
- A gente faz massagem um no outro para sentir o toque, para humanizar. Isso faz com que eles se sintam amados - conta.
Segundo Tia Sônia, os pais que podem fazem “doações mensais” no valor que puderem pagar para ajudar na manutenção.
- Quem não pode não paga - conclui.
Espaço ensina alunos com dificuldades
As
três salas de aula do Centro de Estudos Alternativo também comportam
alunos que não aprendem, porque não conseguem entender o conteúdo das
matérias ensinadas na escola. Segundo a tia Sônia, cerca de 32 deles têm
dificuldade para assimilar as disciplinas. Outros chegam lá com
problemas de fala, de surdez ou de gagueira.
- Para alguns a aula é
de reforço. Mas para a grande maioria, somos nós que ensinamos porque
na escola eles têm dificuldade de aprender - diz Sônia, re$se à equipe
formada por Déborah Rodrigues, Carla Rodrigues, Thaianne Francelino,
Rita da Silva, José Assis, Jorgina Bicalho e Aparecida.
Dona Lurdecy da Silva, de 62 anos, que é tia do aluno Márcio da Silva, de 10 anos, faz coro:
-
Percebi algo quando pedia a Márcio para refazer o dever de casa e ele
colocava respostas diferentes às perguntas. Entreguei nas mãs da Tia
Sônia. Minhas duas netas já estudaram aqui. E só melhoraram - avalia.
Amigos do bairro e da Educação
O
sonho de Sônia de Sousa de ser mãe é carioca, pois nasceu aqui, assim
como os quatro filhas dela. O de ser professora é de Belém do Pará,
onde, aos 15 anos, foi assistente no colégio de freiras onde estudou.
Ela veio para o Rio, pois “achava que aqui era a capital da cultura”.
Sônia
se formou professora em um colégio renomado da Zona Sul do Rio, fez
especializações e até deu aulas particulares em Laranjeiras, Leblon e
Ipanema. Mas foi com Santa Cruz que ela se identificou. E também com as
amigas Tina, Selma, Cristina e Elielma, que a ajudaram a abrir o centro.
Na época, dentro de casa.
- Aqui tem o que gosto: o trabalho comunitário e o envolvimento das pessoas - diz ela.
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